Por Thiago Augusto Oliveira de Mesquita*
A mais recente intervenção do Governo Federal no setor do trabalho e na economia foi a edição da Medida Provisória nº 936/2020 (MP 936) publicada em 01.04.2020 em edição extra do Diário Oficial da União.
A medida institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, possibilita a redução proporcional da jornada de trabalho e dos salários, além da suspensão temporária do contrato de trabalho para fomentar as empresas a manterem os seus empregados, diminuindo, assim, a demissão em massa.
Sobre o Programa Emergencial. O Programa Emergencial foi criado com o objetivo de preservar o emprego e a renda, garantir a continuidade das atividades laborais, empresariais e reduzir o impacto social decorrente das consequências do estado de calamidade e de emergência na saúde pública gerados pela pandemia do COVID-19.
São medidas do programa: a) A redução proporcional da jornada e dos salários de até 70%, com preservação da renda; b) A suspensão temporária do contrato de trabalho. Para ambas as medidas será custeado pelo Governo Federal o pagamento do benefício emergencial de preservação do emprego e da renda a todas as pessoas jurídicas atuantes na economia, exceto os órgãos públicos e sociedades de economia mista. Também estão incluídos os empregados com carteira assinada (inclusive aprendiz e regime parcial), independente do cumprimento de qualquer período aquisitivo, tempo de serviço e salário, exceto os que recebem benefício de prestação continuada do RGPS, seguro-desemprego e bolsa de qualificação profissional.
Requisitos para pagamento do benefício emergencial: a) Acordo individual escrito e comunicação prévia ao empregado com no mínimo dois dias corridos de antecedência; b) Aval do sindicato da categoria sobre os acordos firmados, aval este que deverá ser manifestado pelo sindicato no prazo de até 10 dias, contados da comunicação do acordo, conforme decisão liminar tomada pela relatoria do Ministro do STF, Ricardo Lewandovski [1]. O Ministro ainda estabeleceu que a não manifestação do sindicato, na forma e nos prazos estabelecidos na legislação trabalhista, representa anuência com o acordo individual. c) Comunicado ao Ministério da Economia sobre os acordos firmados, no prazo de 10 dias, contado da celebração do acordo (por meio da plataforma Empregador Web).
Acaso o empregador não cumpra o prazo de comunicação ao Ministério da Economia, ele ficará responsável pelo pagamento da remuneração anterior à redução da jornada/salário ou da suspensão do contrato de trabalho, inclusive dos respectivos encargos sociais, até quando a informação for prestada. A primeira parcela do benefício será paga ao empregado em 30 dias, contado da celebração do acordo e conforme a data em que a informação tenha sido efetivamente prestada ao Ministério da Economia. O correto é que a informação seja feita imediatamente e no mesmo dia após a realização do acordo para evitar interpretações da MP que possam prejudicar o trabalhador.
Redução de jornada de trabalho e de salários: A MP 936 trouxe a possibilidade dos empregadores adotarem a redução proporcional da jornada e do salário, de acordo com as seguintes condições: a) Prazo máximo de 90 dias, ou seja, pode ser em contrato único ou fracionado, desde que observe o limite máximo e redução de faixas de 25%, 50% e 70% do salário e jornada; b) Acordo individual escrito e comunicação prévia ao empregado com, no mínimo, dois dias corridos de antecedência.
O empregado intermitente também tem direito ao benefício emergencial, de acordo com o art. 18 da MP 936, no valor de R$ 600,00 pelo período de 3 meses.
Os empregados com mais de um vínculo empregatício poderão receber cumulativamente o benefício emergencial para cada vínculo com redução proporcional da jornada/salário ou com suspensão do contrato de trabalho, exceto o intermitente, que terá direito a um benefício mensal fixo de R$ 600,00.
Se o empregado com redução de salário/jornada vier a ser demitido ele não perderá o seguro-desemprego, já que o recebimento do benefício emergencial não impede a concessão e não altera o valor do seguro-desemprego, logo, se o empregado for demitido ele ainda terá direito ao seguro-desemprego, desde que sejam cumpridos os requisitos previstos na legislação (Lei nº 7.998/1990), quando do seu eventual desemprego.
A suspensão temporária do contrato de trabalho pelo prazo máximo de 60 dias é a segunda principal medida trazida pela MP 936, podendo tal prazo ser fracionado em até 02 períodos de 30 dias cada: Os requisitos são: a) O empregado não poderá prestar nenhum tipo de serviço ao empregador; b) Todos os benefícios concedidos ao empregado devem ser mantidos; c) Acordo individual escrito e comunicação prévia ao empregado com, no mínimo, dois dias corridos de antecedência; d) Estabilidade no emprego durante o período acordado e após o encerramento da suspensão temporária do contrato de trabalho, pelo mesmo período que ela foi originalmente acordada.
A MP também estabelece o pagamento de uma ajuda compensatória de acordo com a receita bruta auferida pela empresa. A ajuda compensatória poderá ser paga de forma facultativa, pelo empregador, mediante valor definido em acordo individual ou em negociação coletiva. Havendo o pagamento, a ajuda compensatória não integrará o salário do empregado, terá natureza indenizatória (não integra base de cálculo do INSS, FGTS, IRRF e demais encargos incidentes sobre a folha) e é dedutível no IRPJ e CSLL de empresas tributadas pelo Lucro Real.
O empregado não poderá pode ser demitido durante o período de redução de jornada/salário ou suspensão do contrato de trabalho, uma vez que de acordo com a MP o empregado terá direito à garantia provisória no emprego (estabilidade) durante o período acordado e após o restabelecimento da jornada/salário ou do encerramento da suspensão do contrato de trabalho. No entanto, caso a dispensa sem justa causa ocorra, o empregador estará sujeito ao pagamento, além das verbas rescisórias, à devida indenização. Vale destacar ainda que a indenização não será aplicada nas hipóteses de dispensa a pedido ou por justa causa do empregado.
Sobre as atividades essenciais, a Medida Provisória determina ainda que a redução de jornada/salário ou a suspensão do contrato de trabalho, quando adotadas, deverão resguardar o exercício de tais atividades, bem como o funcionamento dos serviços públicos de que tratam a Lei nº 7.783/1989 e a Lei nº 13.979/2020. De acordo com o art. 10 da Lei nº 7.783/1989 são considerados serviços ou atividades essenciais: a) Tratamento e abastecimento de água; b) Produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; c) Assistência médica e hospitalar; d) Distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos; e) Funerários; f) Transporte coletivo; g) Captação e tratamento de esgoto e lixo; h) Telecomunicações; i) Guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares; j) Processamento de dados ligados a serviços essenciais; k) Controle de tráfego aéreo e navegação aérea; l) Compensação bancária; m) Atividades médico-periciais relacionadas com o regime geral de previdência social e a assistência social; n) Atividades médico-periciais relacionadas com a caracterização do impedimento físico, mental, intelectual ou sensorial da pessoa com deficiência, por meio da integração de equipes multiprofissionais e interdisciplinares, para fins de reconhecimento de direitos previstos em lei, em especial na Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência); o) Outras prestações médico-periciais da carreira de Perito Médico Federal indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade; e p) Atividades portuárias.
Restabelecimento da jornada/salário e do contrato de trabalho são medidas excepcionais e transitórias, objetivadas apenas ao enfrentamento da crise imposta pela pandemia. Desta maneira, a jornada/salário anterior e o contrato de trabalho serão restabelecidos no prazo de 2 dias corridos, contados: a) Do encerramento do estado de calamidade pública; b) Da data estabelecida no acordo individual como termo de encerramento do período de redução/suspensão pactuado; ou c) Da data de comunicação do empregador que informe ao empregado sobre a decisão de antecipar o fim do período de redução/suspensão pactuado.
O recolhimento para a previdência autoriza o empregado, durante o período de suspensão do contrato de trabalho, a recolher o INSS para o RGPS na qualidade de segurado facultativo. Isso porque, durante esse período, o empregado não receberá salário e a empresa ficará desobrigada de recolher o INSS, logo, esse tempo não irá contar para a sua aposentadoria. Assim, para manter-se segurado, o empregado deverá recolher o INSS de forma facultativa.
As opções apresentadas pela MP 936/2020 deverá auxiliar a manutenção dos postos de trabalho, atenuando o impacto social e econômico infligido pela pandemia do Covid-19.
Por fim, é curial lembrar que foi marcado para o próximo dia 16.04.2020 o julgamento da ADIN 6363 no plenário que decidirá definitivamente sobre a obrigatoriedade do aval dos sindicatos de cada categoria laboral para a validade dos efeitos dos acordos individuais assinados durante a vigência da mencionada MP.
[1] https://www.jota.info/stf/do-supremo/liminar-de-lewandowski-que-exige-aval-de-sindicato-em-negociacoes-ira-a-plenario-08042020
*Thiago Augusto Oliveira de Mesquita é Advogado, formado pela Universidade Federal do Estado do Pará. Pós-graduado em Direito Tributário – MBA/FGV-RIO.
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